Um pouco mais que adolescente, uns dezoito ou dezenove anos, fui convocada para trabalhar como mesária na eleições. Pinheiros, o Distrito de Lavrinhas, a sede da minha obrigatória servidão.
Momentos tensos, periodo da ditadura, dois partidos constavam no rol da escolha do povo: MDB e ARENA.
Ainda...sob a batuta dos coroneis dos partidos e dos lugares, o cabresto seguia solto. Ai de quem ousasse contrariar os senhores feudais!
No dia do evento eleitoral, fatiotei-me a carater, pois a missão exigia rígidos protocolos. Pinheiros dista de Lavrinhas quatro quilômetros, mas o transporte público não chegava até lá. Eu...também, não tinha carro ou não contava com quem pudesse me levar até a Escola destinada. Cheguei com a carona do Presidente da Mesa que, providencialmente, passou pela minha rua. Chegamos exatamente em cima da hora. A fila estava grande. A maioria... pessoas da zona rural... muitos acompanhados dos idosos, com os vestuários de missa ou da festa do padroeiro.
O silêncio reinava. As pessoas falavam baixinho, receosas e cerimoniosas.
Eu, mesária, pensava duas vezes antes de respirar. Parecia que a assombração dos tempos nebulosos travavam os nossos braços, os sorrisos, a cordialidade, a vontade de trabalhar. O medo dominava!
De repente...chegou um figurão, idoso, terno e gravata, chapéu, relógio de ouro com a bela corrente enfeitando o colete. Todos pararam, abriram alas para o importante senhor. Ao chegar à Mesa, identificou-se com cerimônia arrojada e seguiu para a cabine de votação. Sentou-se, em seguida ...levantou-se e começou a procurar alguma coisa nos bolsos. Nada de encontrar! Tratava-se da colinha que esquecera em casa...foi quando exclamou, em alto e bom som... "não consigo me lembrar do número do doutor Maluf!"